Goianinha, 29 de setembro de 2008.
Prezado senhor George Guimarães,
Em seu artigo intitulado “Vegetarianismo radical”, publicado na revista Superinteressante, deparei-me com sua opinião sobre a adoção de uma dieta integralmente vegetariana. Respeitosamente, li-o e, discordando de alguns pontos do que foi exposto pelo senhor, venho por meio desta apresentar-lhe minha opinião acerca do referido assunto.
“Não há diferença entre matar um boi e um cachorro para comer”, argumentou o senhor. Entretanto, o fato de haver ou não essa diferença é de âmbito estritamente cultural. Não era necessário sequer recorrer a duas culturas distintas (como a chinesa e a ocidental) para mostrar que é relativo o modo de avaliar uma determinada situação: bastaria ver uma cena típica da cultura gastronômica ocidental – o comer picanha. O que para alguns pode parecer um suculento prato, em que se pode apreciar uma deliciosa mistura de tempero, temperatura e maciez da carne, para outros se trata do consumo de um pedaço de músculo, amputado da região pélvica de um animal bem maior que o homem. É relativo!
A questão do que comer não se resume só às disparidades entre as culturas e os conseqüentes modos de ver e compreender determinadas situações concretas. Ela se desdobra em implicações econômicas, ambientais, éticas, fisiológicas, filosóficas, históricas e religiosas.
De acordo com o antropólogo físico Walter Neves, da Universidade de São Paulo (USP), “o homem tem dentes e pequenos e sistema digestivo curto, características de onívoros”, o que exemplifica uma adaptação fisiológica dos seres humanos.
Além disso, não podemos comparar de forma alguma o homem aos demais animais. Nossa maneira de pensar não pode deixar de estar permeada de um profundo e racional antropocentrismo, que nos permita reconhecer, simultaneamente, a dignidade do ser humano e o direito que nos assiste de dispor dos recursos naturais – sempre sustentável e conscientemente – para nossa sobrevivência.
No tocante às doenças “causadas” pelo consumo excessivo de carne, é conveniente citar a opinião de Gary Taubes, correspondente da revista americana Science e um dos principais escritores de ciência do mundo. Segundo Taubes, nutrição não é baseada numa simples relação de causa e conseqüência (por exemplo, “quanto mais carne, mais ataques cardíacos”). A carne parece se comportar como mais um fator – dentre muitos – a contribuir para a incidência de doenças. A França, país de pâtisserie, fã ardoroso das carnes vermelhas de todo tipo, onde qualquer almoço começa refogando o que quer que seja em manteiga derretida, tem uma das mais baixas taxas de mortes por ataque cardíaco no mundo. O mesmo se observa na Europa Mediterrânea.
O consumo de produtos animais não é o único responsável pela matança em larga escala de animais. Alguns exemplos ajudam a perceber isso. A gelatina deve sua consistência ao colágeno arrancado da pele e dos ossos das vacas. Aliás, quase todas as comidas elásticas, desde maria-mole ao chiclete, contém colágeno. Filmes fotográficos e de cinema são recobertos por uma gelatina retirada da canela da vaca. Cremes de barbear, xampus, cosméticos e dinamite derivam da glicerina, substância que contém gordura bovina.
Concordo que uma dieta saudável deve ser rica e variada de vegetais. Contudo, para se obter essa dieta, não é preciso aderir obrigatoriamente a um vegetarianismo radical. Consumir unicamente produtos vegetais certamente contribuiria, entre outras coisas, para o desenvolvimento progressivo de um estilo de vida mais saudável e para uma preservação da Terra. Apesar disso, não podemos transformar o vegetarianismo em um ”dogma”, sedimentado em verdades absolutas e de aceitação e extensão universal. Sem mais, despeço-me.
Arlandson Matheus Silva Oliveira
(Colégio Nossa Senhora dos Prazeres, Pré-vestibular)